terça-feira, outubro 02, 2007

A Aventura de um Leitor III

"... a idéia de que o amor, o amor verdadeiro, esse amor que estava além de qualquer estilo, não tinha nada a ver com a efusão, nem com a sensibilidade ou o caráter envolvente dos sentimentos, e tudo, ao contrário, com a precisão, a economia e uma faculdade antiga, injustamente desprestigiada, chamada pontaria. O amor não abraça, pensava Rímini: fere. Não inunda, crava-se..."
Não saber mais de quem era a história, se dele ou dos personagens. Estes eram os momentos de maior vertigem, quando se via no livro, ora como Rímini, ora como Sofia; ou quando percebia que ambos estavam do seu lado o tempo todo.
Num sábado, carregou o livro consigo, lendo-o nos intervalos de um trabalho exaustivo que arranjara. Logo depois de ler uma passagem marcadamente dolorosa, na qual Rímini se esquivava pelas ruas de Buenos Aires, fugindo das lembranças de Sofia, passou defronte a um lugar que acionou suas próprias lembranças. E foi uma dor tão aguda, tão intensa, que fechou os olhos, na esperança de que isto o aliviasse mais rapidamente. E durante alguns segundos, a vertigem de não saber mais se estava no Batel, em Las Heras, seu nome, se era ele mesmo, Rímini, se era ela ou Sofia, onde estava; esta vertigem que o assolava e o levava a reconhecer que estava perdido, que nada, absolutamente nada, o salvaria do mesmo périplo de Rímini, da mesma crueldade de Sofia; durante alguns segundos, esta vertigem o inundou e o fez desejar, infantilmente, a possibilidade do retorno a um tempo onde nada daquilo faria sentido.

Um comentário:

Rodrigo Turin disse...

Cara, esse livro me causou sensações parecidas. Em certos momentos já não sabia quem eram personagens, quem era eu. Cheirar cocaína em cima do retrato da ex e achar que o passado está morto... isso resume tudo.
Que passado é esse, anterior ao próprio tempo, em que poderíamos nos refugiar?